quinta-feira, 26 de abril de 2012

-Você me acha bonita?
-Sim.
-Sabe, a minha mãe era bonita.
(Silêncio)
-Não entendo o mal das mulheres bonitas.
-Não entendi.
-Ela se casou três vezes.
(Silêncio)
-Ninguém a tratou bem.
-Sinto muito.
-Todos, um por um. Todos a trataram como lixo.
(Silêncio)
-E ela começou a se achar um lixo.
-E começou a feder como lixo.
-Parou em um aterro sanitário.
...
-Mas era lixo orgânico. Não se reciclou.

domingo, 8 de abril de 2012

A(maria)

-Nasceu! -Exclamava o médico. 
-A sua filha nasceu!
O médico encostou um corpinho pálido no colo da mãe.
-Escute, escute o coraçãozinho dela.
E a mãe dobrou-se para escutar. Franziu a testa.
-Mas doutor, aqui nada bate.
-A sua filha está viva, senhora.-E realmente estava, só não chorava. -Se esforce mais.
-Doutor, a minha criança não tem batimentos, ela não...
Os enfermeiros a pegaram no colo, ela não batia de fato.
Levaram-na para a sala cirúrgica. Abriram o pequeno corpinho murcho. Ela tinha crânio e veias, artérias, o sangue circulava. Tinha estômago, pâncreas. Digeria. Mas o coração não estava no lá. O caso foi considerado como incrível. Teve alta. Cresceu. Normal. Digeria. Pensava. O sangue passeava em em larga escala dentro dela. Nada palpitava nem ardia.
Maria então encontra a Paixão. Não dentro dela, pois não tinha como conceber. Encontrou a Paixão, uma moça bonita. Maria ardeu. Até que um dia pegaram fogo. Ao acordar ao lado da Paixão ela sentiu pela primeira vez algo pulsar. Demais. Maria incendiou.
Quando foram sepulta-la, não encontraram nem crânio, nem pés, nem mão, só coração.